A perfeição é uma missão impossível

Ao longo do nosso desenvolvimento, podemos aprender que a atenção das outras pessoas, a valorização de quem nós somos, as reações / respostas positivas que recebemos ocorrem em função da avaliação feita ao nosso desempenho nas mais variadas atividades e tarefas. Eu entendo, com base na minha experiência, que errar ou fazer algo de forma insuficiente (segundo os parâmetros estipulados por quem os determina no meu entorno) é recebido de forma negativa ou ignorada, enquanto que, quando faço algo bem-sucedido, recebo afeto, alegria, percebo a satisfação no rosto de quem me rodeia.

Esta aprendizagem não se dá apenas no seio familiar ou escolar, todo o funcionamento da sociedade vai reforçando esta ideia. Assim, a pessoa em desenvolvimento entende que para ser aceite, para ser validada, para se sentir digna de amor, deve ser capaz de atingir padrões altos de exigência. A ideia de perfeição é de tal forma interiorizada que, a partir de certa idade, a pessoa não precisa mais que essa fasquia seja estipulada por algo ou alguém além de si. Ela própria passa a ter um funcionamento que é movido por um ideal de concretização, ou seja, uma tarefa é considerada completa, válida, merecedora de avaliação, quando atingir os critérios elevadíssimos estipulados. Não há margem para o erro. O erro é encarado como fracasso total, o erro significa que não tem valor e resulta diretamente num impacto negativo sobre a sua autoestima. Tudo é entendido de forma absoluta – “ou sou perfeito ou não valho nada” –, motivo pelo qual estas pessoas estão constantemente insatisfeitas consigo mesmas, pois com tais padrões, a desilusão é inevitável.

O facto de querermos dar o nosso melhor naquilo que fazemos é bom e pode ocorrer de forma saudável, se a concretização dos objetivos estipulados não significar pôr em causa a nossa saúde.

De um ponto de vista psicológico, pessoas perfeccionistas correm um maior risco de sofrer de distúrbios alimentares, ansiedade, depressão e outros problemas. Contrariar esta tendência passará por encarar que a perfeição é uma idealização e não a realidade. O real está em movimento, não é algo estanque. Isto significa que nada realizado poderá encerrar, em si mesmo, todas as condições e características que o faça caber nessa perfeição idealizada. É, de facto, uma missão impossível que só servirá para viver uma vida insatisfeita, de frustração, tristeza e desilusão. A vida real acontece num equilíbrio entre o trabalho, o cansaço, as tentativas falhadas e a satisfação, a alegria, o bem-estar.

Como proferido pelo psiquiatra e psicoterapeuta suíço Carl Jung – “A vida acontece num equilíbrio entre a alegria e a dor”.   

Permitirmo-nos a errar, a tentar e a falhar, a buscar compreender e melhorar é libertador. Aceitar a imperfeição como sendo parte da vida real e, ao mesmo tempo o que nos permite crescer, melhorar, aprender, numa construção que ocorre num contínuo desde que nascemos até a nossa morte é seguir um caminho mais leve. Para quem é perfeccionista esta possibilidade pode ser assustadora, porque por detrás dos seus comportamentos está uma crença em que a felicidade e o sucesso só são possíveis pela via do sacrifício. Na verdade, é uma ilusão que dá uma certa sensação de controlo. Mas, se é o seu caso, certamente concorda comigo que também lhe traz muito sofrimento.

Libertar-se dessa tirania autoinfligida é possível através de um processo de autoconhecimento sobre a sua história e a influência que esta teve para que desenvolvesse essas características. É um caminho de compreensão de como a sua história condiciona a sua vida hoje, desenvolvendo uma atitude mais compassiva para consigo. Uma alternativa ao perfeccionismo é possível: uma vivência mais saudável e de maior bem-estar rumo aos nossos objetivos.