Viver é navegar a incerteza

Num mundo onde somos expostos a cada vez mais estímulos, onde as oportunidades parecem fugir-nos entre os dedos, onde a informação chega-nos em grandes quantidades e a uma velocidade impossível de processar com o vagar que seria preciso, a incerteza pauta os nossos dias.

É um desafio permanente para o nosso intelecto que se vê abanado pelas emoções que vão sendo despoletadas por tanto a acontecer. A perceção de incerteza deixa-nos inseguros, ativa o medo de não sermos capazes de dar resposta, coloca-nos num estado de maior vigilância. O desconforto desse estado pede para ser tratado. Compensamos tentando controlar tanto quanto possível as variáveis à mão, ocupando os nossos pensamentos com essa busca incessante por resoluções.

Em algumas áreas, como no trabalho, vamos encontrando a satisfação resultante desse esforço pela utilidade daquilo que entregamos ou, nem que seja, pela remuneração da jornada que nos vai permitindo continuar. Sendo neste campo valorizado, alimenta-se a ilusão que é por aí que encontraremos o alívio da tensão de estar vivo. Tentamos replicar o método para os diferentes campos da nossa vida. Então, a nossa mente liga-se a essa possibilidade, de que pensar sobre tudo nos poderá trazer algum conforto, alguma segurança num mundo incerto. Essa tentativa de controlo por via de uma elaboração infinita dos questionamentos leva-nos a lado nenhum. Mas, a crença de uma possível resolução ser atingida por essa via já nos sequestrou à partida.

Adoecemos quando negligenciamos o valor de experienciar a vida ao invés de pensá-la. De confiarmos no conteúdo do “palpável”, das sensações absorvidas pelo corpo através do encontro, de um riso partilhado, de palavras trocadas, de um abraço apertado ou do simples contemplar da natureza. Cultivar esse terreno é ir contra a corrente do mundo contemporâneo. É decidir, todos os dias, de forma consciente, que faremos por viver esse equilíbrio. Tememos uma evolução em que sejamos substituídos por máquinas e não vemos que o perigo está em sermos moldados à sua imagem. O que nos diferencia delas é, precisamente, essa parte “inútil” que nos compõe, essa parte que é ser e estar com os outros, com o mundo, sentir os pés a pisar a terra e a brisa que tange o nosso corpo. Regressar ao aqui e ao agora, com aceitação da nossa experiência e gratidão pelo que somos hoje.